Verão
Saudações a tudo que se manifesta por ondas.
Saudações aos que fiam, aos que tecem, aos que cantam e aos que nadam
como as Nereidas, as personificações das ondas. Saudações aos que apostam na
mega da virada, aos que jogam na bolsa, aos que trabalham com moda, aos que não têm emprego fixo, aos que não
têm salário fixo, aos que surfam, aos que vivem seus altos e baixos, cristas e
vales, aos que vivem
entre o nascimento e a morte.
Saudações aos contrastes, ao preto e branco. Saudações aos que
mergulham nas escuras águas profundas e aos que flutuam na clara espuma da
superfície.
Saudações à passividade, aos que se deixam levar ao sabor das ondas.
Saudações aos que conhecem a força que ergue as ondas com violência.
Aos que conhecem a força da inércia.
Saudações às ondas do verão, às ondas do mar, às ondas de calor, às
ondas do calçadão. Conheçamos a frequência do que se move periodicamente.
Saudações à fonte de tudo que se manifesta por ondas.
Equinócio de outono
Uma questão de tudo ou nada
[...] o Mistério da Vida
não pode ser decifrado de modo fragmentado. Não podemos decompor o Grande
Mistério em uma quantidade de problemas elementares para, então solucioná-los
um a um, embora seja isto o que a filosofia moderna tenta fazer. A resolução do
Mistério depende de obter-se uma visão sintética do Eterno e não de reunir as
soluções separadas e parciais obtidas por meio do processo analítico do
intelecto. É uma questão de “tudo ou nada”.
I. K. Taimni – A Ciência do Yoga
Deixando a Casa da Flôr
1. Se dá voltas a uma escultura,/ o corpo é que a envolve, livre;/ se
penetra em qualquer pintura/ como janela que se abrisse;// se pode boiar numa música,/
nos pauís doentes de que consiste;/ se pode ir em fins de semana/ a romances
que tenham o “habite-se”.//
2. Mas só a arquitetura é total,/ não virtual, ao corpo que a vive,/
ainda mais se essa arquitetura/ numa cidade se urbanize;//
Com os versos de João Cabral de Melo Neto nos despedimos da Casa da Flôr.
Aproveitamos para
agradecer ao sobrinho-neto de Seu Gabriel, que nos acompanhou durante a nossa visita, que contou histórias
sobre a casa e que se despediu de nós recitando uma poesia. Retribuímos agora
com os versos do Ferrageiro de Carmona.
Explicaria o Ferrageiro que as flores de Seu Gabriel são “flores
criadas numa outra língua,/ nada têm das flores de fôrma moldadas pela das
campinas”. A Casa da Flôr não é feita de “[...] uma flor já sabida,/ mas do que
pode até ser flor/ se flor parece a quem o diga”.
E nós, blogueiros, explicaríamos ao Ferrageiro que não foi a força com
que se trabalha o ferro forjado, material de grande resistência, que deu
limites às flores de Seu Gabriel. As flores de Seu Gabriel são feitas de
materiais de pouca resistência, que se quebram facilmente. Foi a força do
pensamento que uniu os cacos, dando-lhes uma nova forma.
Nos posts de Nossos Estudos Poéticos, a arquitetura da Casa da Flôr tornou-se
virtual. Em Nossos Estudos Poéticos, os mosaicos de Seu Gabriel tornaram-se
tesselas de nosso mosaico. Que todas as tesselas venham a ser um mosaico. Que
todos os fragmentos venham a ser tésseras. Que tudo floresça e, depois, volte a ser uma semente.
No jardim da Casa da Flôr
a rosa dos ventos, a rosa de ouro, a Rosa de Hiroshima, a Rosa
Cândida, a rosa-cruz, a rosa mística, o lótus, a hortênsia, a anêmona, o narciso, o lírio, o girassol vítreo, a taça de vida, a chuva, o orvalho, a alma, o coração, o amor, uma roda, uma rosácea gótica, uma mandala, uma pedra de roseta, de a a ksha,
do alfa ao ômega, de A a Z: um rosário
Tentativas de resposta
Luz queimada
Nas ruas, as casas e os prédios começam a ser enfeitados para as festas de fim
de ano com os tradicionais pisca-piscas. Dentro da casa do artista, olhando para o alto: um mosaico de lâmpadas queimadas –
como palavras que perdem seu significado, como símbolos que viram enfeites, como mundos que deixam de existir.
Descrição ou discrição
“Qualquer descrição desse mundo só pode ser vaga, indireta, simbólica
ou expressa por meio de negativas”, é o que nos diz Taimni. Consultando o
dicionário Aurélio, encontramos que descrição
é a exposição circunstanciada feita pela palavra escrita ou falada. Ampliando seu significado, podemos
ainda dizer que descrever é contar minuciosamente, fazer uma enumeração ou
relação. O problema é que, enquanto presos a nomes e formas, não podemos
conhecer as coisas como elas realmente são. Daí a dificuldade de descrever o
universo em que vivemos.
Fazer uma descrição cheia de predicativos a partir do conhecimento de
inúmeros fatos ou minúcias de um determinado tipo torna-se inútil se não
conhecemos a relação fundamental entre os fatos, se não conhecemos sua natureza ou qualidades essenciais.
Enquanto vivermos no reino dos nomes e das formas, não haverá razão
para não aproveitarmos as respostas que nomes e formas nos tragam. No entanto,
há de se desenvolver a discrição para alcançarmos a real descrição do mundo. Discrição aqui no sentido de discernimento – a qualidade de quem sabe guardar segredo.
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