Leilão de túmulos


Leilão de jardim – Cecília Meireles

Quem me compra um jardim com flores?
Borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?

Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?

Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?

(Este é o meu leilão.)


Morte e vida severina – João Cabral de Melo Neto

— Essa cova em que estás,  
com palmos medida,  
é a cota menor  
que tiraste em vida.  

— é de bom tamanho,  
nem largo nem fundo,  
é a parte que te cabe  
neste latifúndio.  

— Não é cova grande.  
é cova medida,  
é a terra que querias  
ver dividida.  

— é uma cova grande  
para teu pouco defunto,  
mas estarás mais ancho  
que estavas no mundo.  

— é uma cova grande  
para teu defunto parco,  
porém mais que no mundo  
te sentirás largo.  

— é uma cova grande  
para tua carne pouca,  
mas a terra dada  
não se abre a boca.  


Aos poetas etruscos – Richard Wilbur

Sonhai com fluência, irmãos calados, que na infância
Tomastes com vosso leite materno a língua materna,

Em cuja pura matriz, unindo mundo e mente,
Lutastes para deixar alguma linha de verso

Como fresco rastro em campo de neve,
Não avaliando que tudo podia derreter e sumir.