Campus Martius II

II

que é teu rosto?
é pensamento que não é pensamento algum?
é este vazio repleto de algo que apenas pressinto?
que movimento é possível no que não existe?

recruta recruta recruta
o olhar não alcança
pois não há o que esta mão alcançar
ainda
esta mão acostumada às ruas
a tocar nas maçanetas das portas
a trocar dinheiros resfriados
a tirar as fezes do cachorro
a coçar o olho a boca o nariz
a tapar o buraco da pia
a destapar o bueiro da chuva
a limpar o rastilho de pólvora
a torcer e a rezar de mãos dadas
esta mão
não toca o movimento, o vazio, o pensamento
(e demais abstrações)
            esta mão não toca
a morte, mesmo que segure as armas ainda
            não toca a luta,
embora mantenha o próprio peito à mostra
não toca a vida, ainda que sustente o parto às mãos.


Visões do fazer poético

¿!  A poesia do homem pleno consiste em fazer com leveza as coisas pesadas.
¿!  A poesia do homem pleno consiste em fazer com facilidade as coisas difíceis.
¿!  A poesia do homem pleno consiste em fazer com suavidade as coisas amargas.
¿!  A poesia do homem pleno consiste em fazer com alegria as coisas tristes.
¿!  A poesia do homem pleno consiste em fazer com sorridência as coisas dolorosas.


Resposta

Resposta – 1) Ato ou efeito de responder. 2) Aquilo que se diz ou escreve para responder uma pergunta. 3) Refutação, replicação. 4) O que decide, ou explica alguma coisa; solução. 5) Carta que se manda ao remetente de correspondência recebida, e que versa sobre o mesmo assunto. 6) Qualquer ato que se segue a um estímulo exterior e a ele está imediatamente ligado. (Adaptado do Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa)

Respostacruzamento do latim reposita, particípio passado feminino de reponere – repor – com respondere, que substituiu responsum; a variação antiga reposta procede diretamente de reposita. Século XIII; reposta, século XIV. (Adaptado do Dicionário Etimológico)

Reponere – recolocar, repor, restabelecer, tornar a levar à cena, reproduzir; trazer para trás, dobrar, torcer, abrandar, acalmar; fazer resistência; reservar, guardar; substituir; pousar sobre, firmar, apoiar; entregar, confiar; largar, deixar, cessar. Respondere – afirmar; prometer; apresentar-se, comparecer; ser refletido; estar face a face de; corresponder; o pagar na mesma moeda; ser semelhante; satisfazer; dar bom resultado, obedecer à; ir bem, prosperar; produzir efeito, ser eficaz; resistir a; voltar periodicamente, pertencer a, tocar. (Adaptado do Dicionário Latino-Português)

Resposta – eco, negação, divergência, oposição, o sim, o não, reação, protesto, vaia, desconstrução, emenda, correção, censura, causa, chave, Édipo, oráculo [em resposta]. Contraposição, observação, ponderação, o reverso da medalha, contraindicação [em réplica]. Sagacidade, senso de humor, elegância, sal, graça, repente, sutileza, farsa, brincadeira, malícia, alfinetada, piada, ironia, sarcasmo, ridículo, conceito, jogos de palavra [em espírito]. Descobrimento, invento, criação, lampejo, achado, encontro, desenredo, resolução de uma dificuldade, desvendamento, saída, resultado, revelação, desencanto, soltura, raízes de uma equação, heureca! [em descoberta]. Inteligência, desenvolvimento, exposição, significação, elucidação, desembrulho, esclarecimento, glosa, cabala, versão, segredo, novelo, fio, ilustração, exemplificação, luz, leitura, construção, equivalente, analogia [em interpretação]. (Adaptado do Dicionário Analógico)

Chavesímbolo do mistério a penetrar, do enigma a resolver, da ação dificultosa a empreender, das etapas que conduzem à iluminação e à descoberta. O simbolismo está relacionado com o duplo papel de abertura e fechamento. É, ao mesmo tempo, um papel de iniciação e de discriminação. Um duplo aspecto do poder: a chave liga e desliga. Escreve Dominique Zahan que os bambaras dizem que “tudo o que se diz, tudo o que se faz, no homem, no reino, no mundo, é porta”. A chave simboliza aquele que detém o poder de decisão e a responsabilidade. O emblema do deus romano Jano é composto por uma chave de ouro e outra de prata e corresponde à autoridade espiritual e às funções régias. As chaves de Jano abrem também as portas dos solstícios. Ele é considerado como o guia das almas, guardando todas as portas e governando todos os caminhos. (Adaptado do Dicionário de Símbolos)

JanoÉ o guardião do universo, o abridor e fechador de todas as coisas, olhando para dentro e para fora da porta. É também o deus dos inícios – por exemplo, do primeiro mês do ano Januarius. Suas duas faces, uma voltada para frente e outra para trás, sugerem vigilância constante e sabedoria como conhecedor do passado e adivinho do futuro. O templo de Jano era um pequeno santuário de bronze no Fórum, com portas abrindo para o leste e para o oeste. As portas só ficavam fechadas em tempo de paz, ou seja, raramente. (Adaptado do Dicionário de Mitologia Grega e Romana)


Poesia do link

MAIS RELAÇÕES, MENOS PALAVRAS.


Campus Martius I

I

teu rosto de soldado é informe
é teu o pensamento sem fronteiras
o vazio antes da criação
o movimento silencioso, sussurrante, arrastado
arrastando-se por sob a vista
sem que a vista veja
sem que a mão toque
                        sem que exale cheiro
                        sem que sequer sinta

em mim
teu rosto é informe, Poema.


Leitura silenciosa

LER POESIA PARA OUVIR O CANTO DA VOZ INTERNA NO SILÊNCIO DO MUNDO.


Campus Martius – início

Ela chora, insensato, porque já viveu!
E porque vive ainda! E o que ela enfim deplora
E que até os joelhos vem dar-lhe frêmito atroz,
É que viva será amanhã como agora!
Amanhã e depois e sempre!... como nós!


 A máscara, C. Baudelaire


Mangifera indica – 13/10




13/10   Semelhante a um coração que se inverte
Semelhante a um coração que se repete
Semelhante a um coração que se assemelha
Do radical
deriva o prefixo
movimentando um coração ideal
A mangueira
é a árvore da manga
A manga
é o fruto da mangueira
De derivação em derivação
move-se a árvore
arvorecendo famílias de palavras
Por entre o tâmil e o malaiala
por entre o português e o latim
ao longo do tempo dos caminhos linguísticos
De onde vêm os nomes?
Que movimentos formam na realidade as palavras?

Olhando a árvore pela janela:
no dia de finados
os corações defuntos não amadurecidos
arrancados pela tempestade passada
já haviam sido colhidos do chão
E o verde da copa alaranjado
e o réquiem pela cigarra cantado
recolhiam o fim de um feriado prolongado

Olhando as figuras pela palavra, pelo pensamento, pela construção:
é esta mangueira todas as mangueiras e todas as árvores
são todas as árvores a incorporação do movimento


13/9       13/11


O grande verso

O GRANDE VERSO UNE A INSEPARÁVEL TÉSSERA.


Face universal

Facies totius universi, quamvis infinitis modis variet, manet tamen semper eadem.

A face [aparência] de todo o universo, conquanto varie de infinitos modos, permanece contudo sempre a mesma.

Spinoza


Visões poéticas revistas

¿!  Uma verdade poetizada pode ser transformada em uma ficção poética.


Forma e conteúdo

A FORMA DO POEMA É CÍCLICA. É CÍCLICO O CONTEÚDO DO POEMA.