3) O Mahabharata – No princípio


Eis que nasceu o mundo maravilhoso,
Num instante ele morre,
E num sopro se refaz.

Pela lentidão de nosso olho
E a rapidez da mão de Deus,
Nós acreditamos no mundo.


No princípio houve o amor. Amaldiçoado o que torna o amor inútil e bendito o que ama sem nunca ter visto. Mas, na história de guerreiros, até o deus do amor apresenta-se armado. Kama carrega o arco mais poderoso do mundo. Feito de cana-de-açúcar, sua corda é uma fileira de abelhas e suas flechas têm pontas de flor. Houve o amor de Ganga, a deusa do rio, pelo rei Bharata Santanu; houve o amor de Gandhari pelo rei cego Dhritarashtra; houve o amor de Pandu por Kunti, mãe de Karna, Arjuna, Bhima e Yudhishthira; houve o amor de Pandu por Madri, mãe de Nakula e Sahadeva; houve o amor de Draupadi, a nascida do fogo de Shiva, pelos seus cinco maridos Pandavas. Houve muitos outros amores. Talvez, em algum aspecto, o próprio Duryodhana tenha amado Draupadi. 

No princípio houve as armas. Foi ensinado a cada guerreiro o que eles podiam aprender. Ao melhor deles, revelaram-se as armas. Arjuna, o príncipe argênteo, permanecia com seu arco tão estirado que formava um círculo. Os olhos do melhor arqueiro de todo o mundo só viam o alvo, nada mais podiam descrever. Prometeu ao seu instrutor que sempre lutaria para vencer. O deus do fogo Agni entregou à Arjuna o arco Gandiva, duas aljavas de flechas que jamais se esgotavam e uma carruagem onde havia um disco de ferro para Krishna. Bhima, o de olhos cinzentos, arrojava uma pesada clava octogonal. Yudhishthira, o de olhos dourados, era o melhor auriga. Sahadeva, o que sabe o que é verdadeiro, e Nakula, o que tudo descobre através da amizade, eram os melhores espadachins.




No princípio houve a amizade entre Krishna e Arjuna. Narayana conhecera Nara há muito tempo, às margens de uma água que era leite. Arjuna lembrou-se da alta árvore de Narayana, mas a lembrança esvaeceu-se. Krishna sorriu e abraçou Arjuna. Todos os deuses vieram ver os dois – a alma de toda a vida e seu amigo de outrora. Indra, o senhor dos deuses, reconheceu que ninguém pode lutar contra eles dois juntos. Os deuses sumiram. Krishna riu: “Bharata, ESTE é o mundo. Não há nenhum outro!”. Não existe ninguém que possa compreender a diferença entre estes dois amigos.

No princípio houve a construção do palácio dos pandavas. Maya, o que trouxe para Arjuna a trombeta de búzio Devadatta, manteve-se oculto e invisível até terminar a construção. Sobre mil colunas de ouro, um edifício mágico de mármore e pérolas. Arjuna quis saber se o palácio era uma ilusão. Maya, o construtor, disse que não sabia. Krishna riu.

No princípio houve o desafio do jogo de dados no qual as naturezas das personagens se revelaram. A de Arjuna era falar claramente. A de Yudhishthira era não poder recusar um desafio. Ele não tinha medo: sucesso ou desventura viriam, jogando ou não. Duryodhana era o que era e seguia a sua própria natureza. Somente a insatisfação o conduzia à felicidade. Yudhishthira perdeu tudo que tinha para Duryodhana e os kurus. Perdeu o reino, os irmãos, perdeu a si mesmo e perdeu Draupadi. Foi quando ela pensou em Krishna. Antes que o pensamento estivesse plenamente formado, Krishna foi até Draupadi, que teve suas vestes arrancadas. Mas ela trajava outra por baixo. Esta também foi arrancada. Mas Draupadi trajava outra por baixo. Trinta mantos finos e coloridos espalharam-se pelo chão – eles nunca veriam Draupadi. O rei cego libertou Draupadi e seus maridos. Jogou-se o último lance. O perdedor seria banido para a floresta, obrigado a passar 12 anos em exílio. O ganhador ficaria com todo o reino, devolvendo a metade para o perdedor quando o exílio terminasse.

No princípio houve o exílio. Vidura descreveu a partida dos pandavas e de Draupadi para o rei cego. Arjuna ia por último, lançando docemente grãos de areia com as duas mãos, como haveria de lançar flechas na batalha. E porque era a primeira no coração de todos, Draupadi, linda como a lua cheia, caminhava à frente. Chorava e cobria o rosto com suas mãos de lótus. Lakshmi havia sido insultada em pessoa.

No princípio houve o consolo de Krishna: “Princesa Draupadi, permaneceremos na roda da vida que gira e gira. Agora somos reis, logo passamos uma existência na crista de uma folha de relva. Mas vivemos sempre. Nada pode deter a roda. Quando lhe sobrevém uma felicidade, você não hesita em acreditar que ela seja real? Então, não aceite o infortúnio sem pô-lo à prova. Nada sabemos; ele talvez desapareça, talvez nem seja verdadeiro”.




Fonte da imagem: circunferência e círculo


O segundo tremor

NÃO, NÃO QUERO NADA: A TERRA TREME, DEPOIS TREME DE NOVO. OS TEMPLOS CAEM, A POEIRA LEVANTA, AS AVES LEVANTAM VOO.

SAUDAÇÕES AO INVERNO DOS NOSSOS TREMORES DE FRIO E DE MEDO


Equinócio de Outono        Equinócio de Primavera


Sutra: o significado

O esforço para se reconhecer o “fio” oculto do raciocínio, sob ideias aparentemente desconexas, muito frequentemente fornece a chave para o significado de muitos sutras.

A necessidade de lutar com as palavras e as ideias e delas extrair seus significados ocultos assegura uma assimilação bastante completa do conhecimento e desenvolve, simultaneamente, os poderes e as faculdades da mente, em especial aquela capacidade de extrair da própria mente o conhecimento nele oculto.

Ao longo do tempo, é possível que tenham ocorrido alterações fundamentais no significado das palavras e nos padrões de pensamento. Este fato gera infinitas possibilidades de enganos e interpretações errôneas de alguns sutras.

Verificar as verdades básicas do que é exposto através das experiências pessoais ajuda a manter vivo o que está nos sutras e a preservar os significados das palavras. Divorciada de sua aplicação prática, a exposição tende a perder-se num emaranhado de palavras que perderam seu significado e sua relação com os fatos


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O significado interno

O SIGINIFICADO INTERNO DE UM POEMA É UM ESTADO DE CONSCIÊNCIA A SER REALIZADO.


Fonemas e sílabas d’água: vam

Na escrita devanagari, com a letra va formamos o som vam, a semente verbal da água.

Uma semente caracteriza-se por ser constituída em camadas. As externas protegem, as internas guardam o que é real e essencial. Qualquer objeto apresenta diversas camadas de significado.

Outra característica da semente é que ela germina no solo.

As palavras e o que elas representam apresentam sementes sonoras e germinam em versos. Os nossos versos são de cansaço, água e descanso.